terça-feira, 10 de janeiro de 2012

Riparofagia

     Eis o episódio que acabei por assistir ao retornar para casa:
     Uma mulher, esquelética por demais, a colher seu ganha-pão na reciclagem. E tudo para ela que fosse plástico era reciclável, tamanha era a sua fome, e gigantesca a sua necessidade. Pensando um pouco na tal coletora, penso também nos coletores de muitas outras coisas assim tão imundas, os amantes da imundície, os riparofágos que perambulam por aí: famintos e necessitados de uma vida melhor. Alimentados pelo desasseio que lhes vem que lhes cabe no bolso e no estômago. Assim, e não de outra forma, é que podem viver. Leitor, pense um pouco. Pense um pouco em como tu vives hoje, olhe para seu prato de comida e também para sua geladeira. E aproveita tu o que tens. Porque há quem nada, absolutamente nada, tem para cobrir o vazio que sobra no profundo do estômago e pior ainda, o vazio da alma.

     Com isso, posto abaixo um poema que li algumas vezes na minha vida, e todas as vezes que me deparei com ele, refleti um pouco sobre como vivo e como se vivem por aí a fora. Aí está:

"Vi ontem um bicho
Na imundície do pátio.
Catando comida entre os detritos.

Quando achava alguma coisa,
Não examinava nem cheirava.
Engolia com voracidade.

O bicho não era um cão,
Não era um gato,
Não era um rato.

O bicho, meu Deus, era um homem."
Manoel Bandeira.

N.R. Riparofagia: hábito mórbido de comer imundícies, comedor de esterco.
Desasseio: sujeira, imundície.

2 comentários:

  1. Me lembro que quando criança reclamava muito da comida que minha mãe fazia.
    Hoje penso muito antes de criticar alguem sobre esse assunto.

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    1. Husshausahusahas. Eu também já reclamei muito, mas, ao observar como tantas pessoas passam fome e sofrem para conseguir um prato de comida, eu critico apenas quando for algo que realmente não gosto (jiló, berinjela e tomate; por exemplo).

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