Fui atropelado esta tarde. Vi
toda a vida em instantes, e ela passava aos milésimos de segundos diante de
meus olhos. Difusa, confusa. O interprete da consciência disse que iria me
abandonar, eu só tinha mais uns minutos, indecisos minutos. A música soava ao
fundo, calma, aconchegante. Era uma música fúnebre até, acho que a mais
conhecida de todas. E nos meus dantes risonhos pensamentos observei o mundo
girar. O mundo, este maestro das coisas e de tudo, guia os movimentos e
determina começo e fim. Desenhava no ar com sua varinha os compassos para a
música, meu corpo era obrigado a dançar conforme o tom. O ritmo não era meu,
nunca foi. E esta tarde então me foi passando, deixando de lado momentos e
conquistas. Criações e destruições, o buraco mais fundo do viver. A lacuna sem
qualquer necessidade, onde está aquele sonho que deixamos de conquistar. O
caminhão de confusões e problemas havia me engolido por completo, já não era
mais quem queria; se bem que acho que nunca fui. Queria ser apenas eu e ter a
vida minha de volta. Quando criança, talvez o fosse e de mim fosse minha a vida.
Mas, o tempo passou, a vida mudou. Olhei para meus ferimentos, não existia
sangue ali. Seja por que não eram machucados graves, seja por que meu corpo não
comportava, contudo, não havia sangue ali. E a encapuzada morte se aproximava
paulatina, calculista e fria. Meu momento, meu instante. A hora. Quem sabe se
minha filosofia não valesse nada, ou meus dizeres sequer tivessem sido ouvidos.
Horas e mais horas de cogitação, pensamentos à toa. Jogados no mais profundo
abismo da mente, uma mente que agora se esvaía aos poucos. Acordei, sim, sabe
lá deus quanto tempo depois, mas acordei. Estava no meu quarto, deitado na
cama. Senti as dores em meu peito, sabia que tinha perdido algo em mim. Algo
que, de algum modo incompreensível ou não, me completava. Bem, não sei direito
como foi ou o que perdi. Sei: fui atropelado esta tarde.
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